Quando vem um enorme ataque de sensibilização - por causa de algum grande acontecimento chocante que se enquadre nas categorias coletivas ou pessoais de classificação como um grande acontecimento chocante - é como se o corpo passasse por um ralador de carne super-dimensionado que tirasse uma das camadas de pele de todo o corpo. E assim, é perdida a maior das membranas de frieza que se recebe da vida para enfrentar o mundo. O mundo muda mais conforme a maior perda de camadas, porque o ser vai se tornando permeável, e o mundo nunca deixou de ser invasivo.
Eu adquiri um mecanismo de radar visual, maior capacidade de reconhecimento tonal auditivo, acuidade gustativa, hipersensibilidade olfativa. E, principalmente - porque a pele vai ficando mais e mais fina -, adquiri uma capacidade sobre-humana quase como aquela que os cegos têm de saber pelo tato. Eu sei, e quero saber pelo tato, e enxergar de olhos fechados a mudança de texturas e alturas e calor e com isso saber a diferença do que deveria ser certo e do que se devia considerar errado. E tatear para casa, só para sentir por contraste a incrível maciez aveludada daquela que eu chamo de minha casa.