Dez coisas não necessariamente cults que me fariam uma pessoa mais feliz:
- ter a minha oficina em casa
- ter um jardim no telhado
- ter um quartinho chuvoso
- ter a minha doceria
- aprender a desenhar
- aprender a cantar
- ter tendência a emagrecer
- a existência de uma loja feminina só de camisas
- não ser tão influenciável pelos outros
- mais tolerância e respeito no mundo
A alto grau de futilidade/simplicidade desta lista é paradoxalmente bom, pois indica que as outras áreas da minha vida estão bem resolvidas. Uau.
domingo, 27 de março de 2011
sábado, 26 de março de 2011
O mundo é um conjunto de virtudes que devem ser cumpridas e suas respectivas negativas de punição. Mas eu nunca entendi a arbitrária atribuição de valor a quem segue corretamente a tabela das consideradas ações do bem. Pensem: quem é mau caráter, odeia praticar boas ações, mas as pratica mesmo assim, é alguém bem visto - claro! "Ora, veja só, mesmo não sendo sua obrigação, ele cuidou da mãe por vários anos quando ela ficou doente!". Mas tem aquelas pessoas que gostam de fazer o bem, que se sentem bem fazendo o bem, se orgulham de ter feito o bem e se vangloriam! de ter feito o bem. Mas isso é pecado - o orgulho. E não só o orgulho exagerado, que torna a pessoa metida perante a sociedade, mesmo o orgulho contido, o orgulho baixinho e pessoal, traz uma atrelada sensação de culpa. No primeiro caso não há esse problema, para seus praticantes a tal boa ação é forçada, é externa, não é motivo de orgulho - por isso são encarados como humildes.
Por que essa enorme carga de auto-controle e falsa modéstia? Por que o culto à extra-humildade forçada? Afinal, é mentira dizer que se faz algo em nível mediano quando se é perito no assunto, não? - os gregos já eram intolerantes à falsa modéstia, por que essa total inversão contemporânea?
O pior de tudo é que eu quase nunca consigo me libertar dessa pressão social.
sexta-feira, 25 de março de 2011
Ah, não quero escrever hoje, pode ser?
Como não? Eu sei que você tem muitas coisas presas aí dentro querendo ser ditas.
Mas não sei como acioná-las manualmente. Normalmente elas só saem e pronto.
E se você tentar verbalizá-las?
Tenho uma vontade de me engolir e cuspir do avesso, me engolir do avesso e cuspir certo.
O que significa isso?
Tem algo a mais em mim, quero fazer uma lavagem corporal.
Escreva sobre isso, como você sempre faz.
Não quero começar dessa vez, sou sempre eu que começo! Parece que o que eu exponho é sempre uma oferta sem demanda. Quero guardar tudo comigo até eu explodir.
Tudo bem: eu começo. Por favor, diga-me o que você tem, como você se sente. O que está acontecendo? Eu quero muito saber.
Isso pode durar anos. E pode ser enfadonho.
Tudo bem, por favor, diga mesmo assim!
Era isso que eu precisava ouvir; mas não de mim mesmo.
quarta-feira, 23 de março de 2011
A felicidade é um paradoxo. Quanto mais para o alto se sobe na escala da felicidade, maior é a distância da ordinário, do tedioso - do sacrificador -, mas maiores são os danos do retorno. Quanto mais alto se chega, maior é a adrenalina, mas maior é a vertigem. A queda do topo seria mortal - no mínimo, dolorosa - enquanto a vivência ao rés do chão dói aos poucos, de uma maneira que mais incomoda que mata. A felicidade é um risco: é dual; a felicidade é ingrata. A felicidade dá um medo constante da não-felicidade; é manipuladora e sádica. A felicidade é muito, mas muito prazerosa.
segunda-feira, 21 de março de 2011
Eu escutei seu coração bater. O corpo e a mente, quietos, serenos, forjadamente indiferentes ao meu acréscimo. Mas esqueceram (?) de desligar o coração. E ele esmurrou, constante, como se fosse me manter ali, como se quisesse me sussurrar no escuro que as aparências eram só convenientes à situação. Ele me dizia: "...a verdade!", ele me dizia que eu mudava tudo e que precisava de mim. E eu sorri, mas ninguém viu - sorri por dentro - e fiquei.
sexta-feira, 18 de março de 2011
Eu tinha chegado no topo, no auge, no ponto culminante do cume da montanha da mais alta... ou pensei que tinha chegado. Quando me coloquei esta dúvida vi uma pequena e pronunciada estalagmite de terra se estendendo mais para cima daquele ponto que eu achei estar mais acima. Não tive dúvidas, me agarrei nesta ponta de utopia com um ímpeto irracional - e ela bambaleou! Ao me preparar para a queda, ao perceber o vento do vazio, me dobrar ao peso da gravidade, sentir novamente o incômodo e perfurador hálito da familiaridade do abismo - ela se enrijeceu, e ereta ficou, oferecendo-me, sádica e brincalhona, mais uma esperança sólida e promissora de ascensão.
segunda-feira, 14 de março de 2011
Eu queria fazer planos: agora! nos exatos minutos em que escrevo estas linhas. Eu gosto de fazer planos, me deixam menos ansiosa e me preparam para situações da vida futura. Eu gosto principalmente de senti-los se tornando realidade, como se o papel e os pensamentos intangíveis e impalpáveis se tornassem corpóreos e pulsantes. Me deixa serena ver que tudo pode se desenrolar exatamente como em uma previsão minha. Por isso eu queria fazer planos, para alcançar o futuro, para estragar a minha própria surpresa e adiantar as reações; porque eu preciso ter reações, eu preciso controlar minhas reações.
É também um pouco porque eu tenho medo - eu tenho muito medo - de perder tudo, e fazer planos que considerem uma não-perda me tranquilizam.
Estou naquele momento em que sinto um calor mentolado de felicidade e apreensão.
quarta-feira, 9 de março de 2011
"Epígrafe
Ela entrou com embaraço, tentou sorrir, e perguntou tristemente - se eu a reconhecia?
O aspecto carnavalesco lhe vinha menos do frangalho de fantasia do que do seu ar de extrema penúria. Fez por parecer alegre. Mas o sorriso se lhe transmudou em ricto amargo. E os olhos ficaram baços, como duas poças de água suja... Então, para cortar o soluço que adivinhei subindo de sua garganta, puxei-a para ao pé de mim e, com doçura:
- Tu és a minha esperança de felicidade e cada dia que passa eu te quero mais, com perdida volúpia, com desesperação e angústia..."
Manuel Bandeira
domingo, 6 de março de 2011
Eu sempre tive pena das borboletas. Elas são muito belas e têm a capacidade de voar por perto das flores; mas só vivem um dia. Imagine que elas passam a vida inteira comendo e comendo para poder formar um casulo e, quando finalmente alcançam a liberdade, alcançam também sua sentença de morte.
Outro dia, entretanto, repensei a questão das borboletas. As borboletas, na verdade, têm muita sorte. Imagine que, depois de passar uma vida inteira sem precisar fazer nada além de comer o que quiserem, as lagartas podem tirar um enorme cochilo e ainda recebem a oportunidade de voar livres por um dia inteiro antes de morrer.
É tudo uma questão de ponto de vista, sempre. E pense, quantos seres humanos - que depois de uma vida sofrida de trabalho duro - não gostariam de receber a chance de conhecer o mundo pelos ares, por um dia que fosse, antes de morrer?
É isso, a perspectiva muda tudo.
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